O QUE VOCÊ ANDA ENGOLINDO?
Minha vontade era te entregar uma pedra de sabão de soda
sobre uma escova de aço, embrulhadas em um lindo laço vermelho.
Pra lavar a boca e limpar todas as palavras que me fez engolir.
Quanto desrespeito você aguenta até colapsar?
Uso da arte para expelir as somatizações das dores do corpo, cada imagem e
pensamento que materializo na performance é como um tarja preta para
(des)controlar os nervos. Tomando de doze em doze horas ou a cada vez que precisar
sentir que a respiração ainda existe sem me sufocar nos arrotos que me calam. Cansei
de lutar com a raiva, de ficar entalada, ter azia e engolir empatia. Temo meus medos a
ponto de encará-los de frente e uso o atestado de transgressão social como aval para
experimentar os fragmentos de liberdade. Infectando o maior número possível de
existências com o vírus do questionamento.
Quantos arrotos você segura sem sufocar?
Aline Luppi Grossi, performer aposentada do nu que não ganha mais a vida mostrando
a bunda e a banha. Mestre em se esconder no melhor lugar do mundo, em frente aos
olhos de todos, nua sob os holofotes. Disponível para a vida a fim de experimentar o
que pode fazer quando está de roupa, não só por ser um corpo gordo, mas por ser
poesia.
Ficha Técnica
Aline Luppi Grossi ------------------------- Criação, Concepção e Performance
Vanderlei Junior --------------------------------------------- Curadoria Expográfica
Rodrigo Munhoz Aka Amor Experimental ---------------------------- Fotografia
Abertura: 17 de Maio às 19h
Performance: 17 de Maio às 20h
Data: 17 de Maio a 08 de Junho
Visitação: Segunda a Sexta, 8h as 21h / Sábados e Domingos, 8h as 20h
Local: Museu de História e Arte Hélenton Borba Côrtes / Teatro Calil Haddad
Valor: Entrada Gratuita
Classificação Indicativa: Livre
Projeto executado com verba de Incentivo à Cultura. Lei Municipal de Maringá N°
9052/2011. Convite às Artes Visuais
@secretariadeculturamaringa
Ficha Técnica:
Criação e Performance: @alineluppigrossi
Curadoria: @vandbjunior
Fotografia: @amorexperimental_
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Uma obra de encerramento
Aline Luppi abre nessa sexta feira, 17 de Maio, sua última exposição do ciclo de performances
do nu. “O QUE VOCÊ ANDA ENGOLINDO?” reúne registros de vários momentos da
performance de mesmo título, em que a artista cria um mural de mesmo título da obra e
escreve suas inquietações, respondendo a questão que nomina o trabalho, podendo ou não
limpa-las posteriormente com uma escova de aço e sabão de soda. Deixando disponível para
que o público componha a instalação com suas próprias inquietações, a interação do público
compõe e constrói a obra ao tempo em que levanta questionamentos e diálogo entre o
público.
Criada em 2018 a obra tem em seu histórico publicações (P6 Revista de Artista. Amor
experimental. São Paulo, 2018), exposições virtuais (La Musea. M.A.M.I, Chile, 2021) e
presenciais (Inferninho da kátya Flávya. A Pilastra, Brasília. 2019; Mostra Cultural ME
CHAMA DE GORDA. Prêmio Aniceto Matti/2020, Maringá, 2022). A proposta surgiu da
materialização de um desejo da artista: “Minha vontade era te entregar uma pedra de
sabão de soda sobre uma escova de aço, embrulhadas em um lindo laço vermelho. Pra
lavar a boca e limpar todas as palavras que me fez engolir.”
Usando da arte para expelir as somatizações das dores do corpo, cada imagem e
pensamento materializado na performance é como um tarja preta para (des)controlar
os nervos. Tomado de doze em doze horas ou a cada vez que precisar sentir que a
respiração ainda existe sem sufocar nos arrotos que entalam, cansada de lutar com a
raiva, de ficar entalada, ter azia e engolir empatia. Temendo seus medos a ponto de
encará-los de frente, dividindo essas inquietações com o público a cada ação, sempre
registrava-se uma lista de palavras recorrentes:
Raiva | Preconceito | Racismo | Gordofobia | EGO | Dinheiro | Desigualdade |
Pobreza | Fome | Descaso | Homofobia | LGBTTQIA+FOBIA | Culpa | Calúnia | Abusos
| Vômito | Estupro | Discriminação | Racistas | Desafetos | Amor | Falso Moralismo |
Fé | Família Tradicional | Fracassos | Solidão | Machismo | Genocídio | Intolerância
religiosa | Cansaço | Sexo | Guerra | Genocídio | ...
Durante a abertura da exposição a performer circula entre o público entregando
canetões e marcadores, os convidando a escrever nos sacos dispostos no centro da
exposição. Em determinado momento a própria performer se coloca a escrever suas
inquietações, iniciando o processo de retirada desses escritos com a escovação do
papel. A ação se desenvolve ao criar um looping entre escrever e arrancar as palavras
da tela. Essa peça ficará exposta e disponível para interação durante todo o período de
duração da exposição
A proposta da curadoria expográfica desse trabalho é destacar os resíduos da obra, tal
qual o processo de digestão das coisas que viemos engolindo guela a baixo
diariamente. No material fotográfico destaca-se os registros das próprias inquietações
da artista. Sob o olhar intimista dessa vivência feminina gorda em processo de
regurgitar suas ansiedades. Na ação performativa temos uma transformação do olhar,
criada em padaria e hoje intolerante a glúten a ação se aproxima do íntimo ao utilizar
aqui sacos de farinha como tela para dividir a inquietação com o público, construindo
um espaço coletivo para expelir suas indigestões e limpá-las da pele com água e sabão
ao esfregar o papel.
Cansada de engolir palavras duras, arrotos e a própria voz, em sua exposição de
encerramento desse ciclo de obras, a artista busca maneiras de não mais engolir. Não
é mais só sobre não engolir, é sobre jogar pra fora e não assumir a responsabilidade
pelas palavras do outro.
“Porque eu não quero mais fazer isso? Porque eu não quero mais engolir!
Cansei de ficar entalada, de ter azia
Porque eu não quero mais fazer isso! Porque eu comecei a fazer isso?
Porque meu corpo já não aguentava mais.
Porque engolir? Porque deixar me ferir para não ferir o outro que sadicamente insiste
em enfiar milhares de faquinhas de serra nas feridas abertas, de novo e de novo e ao
mesmo tempo, em cada minuto do dia?! Cansei de engolir cada vez que sentia
vontade de devolver as palavras que me atingiam. De morrer por dentro me
escondendo no cantinho enquanto a raiva tomava conta de todo mínimo espaço
possível e me deixava de lado. Não cabia mais tanta raiva e revolta dentro de mim. A
garganta sangrava por dentro arranhada pela luta das palavras desesperadas em sair
boca a fora. O sistema nervoso em curto circuito a cada mísero estímulo, enviando
descargas de adrenalina espinha dorsal a fora, reverberando nas extremidades da
lombar e da nuca, explodindo em ondas violentas.
Não quero mais engolir para não ser engolida!”
Aposentada do nu, a mestre em se esconder no melhor lugar do mundo, em frente aos
olhos de todos, nua sob os holofotes. A performer que não ganha mais a vida
mostrando a bunda e a banha segue disponível para a vida a fim de experimentar o
que pode fazer quando está de roupa, não só por ser um corpo gordo, mas por ser
poesia.